O ciclista Gino Bartali se tornou herói na Itália. Um herói da Itália e da humanidade. Não porque ostentasse a fachada de atleta modelo do fascismo sob o regime de Benito Mussolini, como acreditavam seus contemporâneos naqueles sombrios anos 1940. Seu heroísmo se deu pelo motivo oposto, soube-se muitos anos depois. Bartali, um Pelé do ciclismo italiano, eternizou-se como agente antifascista, que, indiferente ao fato de a Itália estar atolada no Eixo ao lado da Alemanha nazista, deu abrigo a famílias judias e transportou, no quadro da sua bicicleta, identidades falsas que salvaram a vida de centenas de judeus.
Conhecido como o Leão da Toscana por sua fibra física e emocional especialmente nos momentos adversos, o ciclista, três vezes campeão do Giro d'Itália (1936, 1937 e 1946) e duas vencedor do Tour de France (em 1938 e 1948), pedalava sua bicicleta em um persistente treinamento para competições suspensas devido ao conflito mundial.
Ninguém entendia tanto esforço supostamente em vão.
O fato é que Bartali, protegido pela fama de ídolo nacional, levava incólumes, de um lado para outro, documentos que salvaram perseguidos pelo horror. Arriscava sua vida, a vida da sua família e a reputação, em uma história que se tornou conhecida depois que ele morreu pelo livro O Leão da Toscana, recentemente lançado no Brasil.
Com descrições de cenas de forte dramatismo, os autores do livro, os irmãos canadenses Aili McConnon e Andres McConnon, retratam uma época em que o heroísmo implicava grande risco. Um risco assumido por setores da Igreja que convenceram o já antifascista Bartali a ser muito mais que um ídolo movido a pedais sobre duas rodas.

Bartali, por motivo de segurança, teria de esconder a missão que assumira até mesmo de sua mulher, Adriana. Certa vez, ela perguntou: "Por que você está treinando, se não tem nenhuma corrida programada?" "Gino parou de se arrumar e se aproximou da mulher. 'Estou só treinando', respondeu, inclinando-se para dar um beijo tranquilo na testa (...)". "Gino queria estar pronto para quando as corridas recomeçassem" — essa era a alegação que ele usava.
Texto: Léo Gerchmann
Fonte: Zero Hora
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